O
editorial do jornal “A Serra”, que circulou em Timbaúba no dia 17 de maio de
1913, seguia assinado por Jáder de Andrade, um jovem jornalista, político e
empresário daquele município, que seria, em poucos meses, nomeado redator do
Diário de Pernambuco. Jáder não hesitou nem mediu palavras para anunciar a obra
de que a cidade mais necessitaria: “Nesta
cidade há, talvez, necessidades igualmente urgentes e imprescindíveis: nenhuma,
porém, mais imprescindível e mais urgente do que a necessidade de um teatro,
condizendo com o adiantamento do nosso desenvolvimento moral e material”. O
Cine Teatro Recreios Benjamin seria inaugurado, sob os seus auspícios
financeiros, na tarde do domingo de 05 de março de 1916, com um programa que
incluiu um documentário sobre a Guerra Balcânica, o drama “Um Segredo” e uma
comédia, do francês Max Linder, “O Enforcado”. Estranhos aos nossos dias, os títulos
estavam em plena sintonia com a década de 1910. Os Bálcãs foram o estopim da
Primeira Guerra; o romance era a forma clássica da narrativa burguesa; e Max
Linder era um grande artista, que Chaplin tributava como seu mestre.
O Cine
Teatro seguiu sendo o palco da cidade. Manoel Borba começou ali a sua campanha
vitoriosa ao governo estadual; companhias de teatro de diversos estados
cruzaram suas coxias; orquestras ocuparam seu proscênio; o seu cinema foi a
janela que alargou o horizonte de mais de uma geração. A agitação cultural e
política dos anos 20 em Timbaúba tiveram ali o um de seus centros, além dos
jornais do lugar. Neste ambiente, nasceram e ganharam o mundo, muitos artistas,
professores, políticos e agitadores culturais de artes várias. Era a coroação
de uma economia que não dependia da cana de açúcar, que produzia muito algodão,
café, frutas, farinha e gado; tudo estimulado pela ferrovia que ligava o Recife
a Campina Grande e atravessava a Mata Norte. O Recreios Benjamin integra um conjunto de outros equipamentos construídos
em situação semelhante, entre 1910 e 1940: o Polytheama, de Goiana; o Guarani,
de Triunfo; o Apolo, em Palmares; o Avenida e o Santa Rosa, em Caruaru; o São
José, em Afogados da Ingazeira.
Na
noite passada de 26 de dezembro, o teto do Cine Teatro desabou, culminando uma
trajetória de descaso e abandono. Tombado pelo estado em 1983, não foi desapropriado.
Seguiu-se um imbróglio em que o prédio não recebia uso pelos proprietários, ao
tempo em que governos diziam não investir por ser propriedade privada. Desde
então, recebeu apenas intervenções pontuais, como uma reforma no início dos
anos 90, em que o palco de madeira foi substituído por um de... cimento. Em
2011, surgiu um movimento de estudantes e professores da rede pública e
privada, reivindicando o cuidado e o bom uso do teatro, que resultou em
audiência até com o governador. A Fundação de Cultura Jáder de Andrade bateu-se
igualmente por esta causa. Seguiram-se diversas promessas, vários gerúndios, e
o prédio continuou fechado, à espera de providências que não foram tomadas. Até
que, quem sabe, sem suportar mais um natal sem uso, os velhos braços de madeira
não suportaram mais e arriaram sob o peso dos dias e a fúria de cupins não
combatidos. Resta a esperança de um projeto de restauração contemplando o seu centenário,
que virá em 2016, e que os governos e a sociedade possam se aproximar da visão
que Jáder possuía sobre a importância da cultura.