sexta-feira, 27 de junho de 2014
A Copa do Mundo e as eleições no Brasil
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quinta-feira, 26 de junho de 2014
Biometria, voto de cabresto e clientelismo
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terça-feira, 18 de junho de 2013
UMA PRIMAVERA BRASILEIRA OU UM INVERNO DA POLÍTICA TRADICIONAL?
Sob
as regras da política convencional, o plano tinha tudo para dar certo. A
presidente da República adiou o aumento do preço das passagens de janeiro para
junho, reduziu impostos do setor de transporte, alguns municípios fizeram até pequenas
reduções no valor da tarifa. Os protestos de praxe se anunciaram, mas, afinal,
também haveria o início da Copa das Confederações, cujo tom da cobertura
poderia ser maior que as vozes dos grupos habituais de protestos. Mas, de
repente, tudo parece que saiu do controle. Ao anúncio de um aumento de R$ 0,20
na tarifa de São Paulo, grupos de estudantes e jovens mobilizando-se pelas
redes sociais marcharam contra o aumento, a PM impediu o trajeto com bombas,
gás lacrimogênio, balas de borracha, com o saldo de repórteres e manifestantes
feridos. A imprensa internacional descobriu uma nova pauta para além da Copa, quem
sabe uma possível ‘Primavera Brasileira’, e, aos primeiros protestos, seguem-se
novos, agora reivindicando pontos tão díspares quanto tarifa zero no transporte
público, recursos para saúde e educação no lugar de grandes estádios de
futebol, e mesmo, uma nova relação nos níveis de representação política, pois,
na onda do momento, “os políticos que ‘estão aí’, não nos representam”.
Há,
sem dúvida, algo de novo nestes protestos. Não são conduzidos por nenhuma das
lideranças ou instituições tradicionais da política ou dos estudantes, embora
se encontrem bandeiras de partidos mais à esquerda no espectro político. Nada
de faixas da UNE ou de partidos tradicionais. Os participantes, parecem
pertencer a uma nova geração que cresceu distante dos canais institucionais de
representação e negociação política, cujos instrumentos de diálogo são
exatamente as instituições, isto é, os partidos, as associações, os sindicatos,
as entidades de classe. É o modo de fazer política clássico dos regimes
democráticos, em que os indivíduos agrupam-se em organismos que passam a
representá-los. Até mesmo a ‘revolução’ seria feita através destas instituições,
no caso, os sindicatos ou o partido. As pessoas filiavam-se a um grupo e
constituíam uma direção, que passava a conduzir os seus representados,
comunicando-se através de plataformas físicas e fixas, como jornais, boletins e
assembleias. Esta ação política tradicional apresenta sinais de esgotamento.
O
caos urbano é apenas uma dimensão, talvez a menor, dos atuais protestos. Muito
mais grave é que as instituições não consigam captar, conduzir, negociar e
estabelecer um pacto social. A falência das grandes utopias, uma geração que
mescla o desejo de mudanças sociais, mas não aceita submeter-se à autocracia de
uma ideologia ou de um partido que suprima sua condição de indivíduo; uma
geração inteira de brasileiros cresceu sob o silêncio e à margem da política
institucional, cujos filhos, hoje, não se sentem representados por ‘suas
excelências’, que aliás, insistem em dar motivos para o descrédito da sociedade
em relação a eles. O surgimento de novas plataformas de comunicação, marcadas
pela velocidade e pelo tempo real, a internet, as redes sociais, que conectam
ponto-a-ponto os manifestantes, provocando a sensação de que são
simultaneamente os partícipes e os líderes de si. Nada de receber
clandestinamente um panfleto para distribuir na porta da escola, cumprindo uma
‘tarefa’ dada pela direção do movimento. Pouquíssimos leram Marx, mas muitos
assistiram ao filme “V de vingança”, cuja máscara do líder rebelde dá o tom das
manifestações. São anônimos, são a multidão. A cena final deste filme, aliás, apresenta
uma multidão enfrentando a polícia de uma Londres que é governada por
autocratas. São uma multidão de indivíduos que usam a mesma máscara de sorriso
debochado. A força das reivindicações individuais está no anonimato da
multidão.
Esta
não é, entretanto, a primeira vez que o povo faz política por fora dos
mecanismos institucionais. Durante a Primeira República, a maior parte da
população estava excluída do fazer tradicional da política. As guerras de
Canudos e do Contestado; a Revolta da Vacina; ou a Revolta da Chibata, liderada
por João Cândido. São todos estes, expressões de uma insatisfação que não era
captada pela elite política do país. A Revolução de 1930 implementou uma série
de reformas políticas e criou uma linguagem política e institucional, principalmente
o Trabalhismo, de Getúlio Vargas, que absorveu e encaminhou parte considerável
dos conflitos sociais, por bastante tempo. Próximos ao centenário daquela
revolução, estamos diante de um certo esgotamento desta linguagem política.
Ironicamente, isso ocorre no auge de um ciclo no qual as questões sociais foram
alvo de diversas políticas públicas. É um novo protagonismo social que não é
exclusivo do Brasil, mas ganhou visibilidade agora e assume ares de um enigma
que tem forças para devorar o próprio governo, se não for desvelado a contento.
quinta-feira, 27 de dezembro de 2012
O telhado do Cine Teatro Recreios Benjamin, em Timbaúba, desabou!
O
editorial do jornal “A Serra”, que circulou em Timbaúba no dia 17 de maio de
1913, seguia assinado por Jáder de Andrade, um jovem jornalista, político e
empresário daquele município, que seria, em poucos meses, nomeado redator do
Diário de Pernambuco. Jáder não hesitou nem mediu palavras para anunciar a obra
de que a cidade mais necessitaria: “Nesta
cidade há, talvez, necessidades igualmente urgentes e imprescindíveis: nenhuma,
porém, mais imprescindível e mais urgente do que a necessidade de um teatro,
condizendo com o adiantamento do nosso desenvolvimento moral e material”. O
Cine Teatro Recreios Benjamin seria inaugurado, sob os seus auspícios
financeiros, na tarde do domingo de 05 de março de 1916, com um programa que
incluiu um documentário sobre a Guerra Balcânica, o drama “Um Segredo” e uma
comédia, do francês Max Linder, “O Enforcado”. Estranhos aos nossos dias, os títulos
estavam em plena sintonia com a década de 1910. Os Bálcãs foram o estopim da
Primeira Guerra; o romance era a forma clássica da narrativa burguesa; e Max
Linder era um grande artista, que Chaplin tributava como seu mestre.
O Cine
Teatro seguiu sendo o palco da cidade. Manoel Borba começou ali a sua campanha
vitoriosa ao governo estadual; companhias de teatro de diversos estados
cruzaram suas coxias; orquestras ocuparam seu proscênio; o seu cinema foi a
janela que alargou o horizonte de mais de uma geração. A agitação cultural e
política dos anos 20 em Timbaúba tiveram ali o um de seus centros, além dos
jornais do lugar. Neste ambiente, nasceram e ganharam o mundo, muitos artistas,
professores, políticos e agitadores culturais de artes várias. Era a coroação
de uma economia que não dependia da cana de açúcar, que produzia muito algodão,
café, frutas, farinha e gado; tudo estimulado pela ferrovia que ligava o Recife
a Campina Grande e atravessava a Mata Norte. O Recreios Benjamin integra um conjunto de outros equipamentos construídos
em situação semelhante, entre 1910 e 1940: o Polytheama, de Goiana; o Guarani,
de Triunfo; o Apolo, em Palmares; o Avenida e o Santa Rosa, em Caruaru; o São
José, em Afogados da Ingazeira.
Na
noite passada de 26 de dezembro, o teto do Cine Teatro desabou, culminando uma
trajetória de descaso e abandono. Tombado pelo estado em 1983, não foi desapropriado.
Seguiu-se um imbróglio em que o prédio não recebia uso pelos proprietários, ao
tempo em que governos diziam não investir por ser propriedade privada. Desde
então, recebeu apenas intervenções pontuais, como uma reforma no início dos
anos 90, em que o palco de madeira foi substituído por um de... cimento. Em
2011, surgiu um movimento de estudantes e professores da rede pública e
privada, reivindicando o cuidado e o bom uso do teatro, que resultou em
audiência até com o governador. A Fundação de Cultura Jáder de Andrade bateu-se
igualmente por esta causa. Seguiram-se diversas promessas, vários gerúndios, e
o prédio continuou fechado, à espera de providências que não foram tomadas. Até
que, quem sabe, sem suportar mais um natal sem uso, os velhos braços de madeira
não suportaram mais e arriaram sob o peso dos dias e a fúria de cupins não
combatidos. Resta a esperança de um projeto de restauração contemplando o seu centenário,
que virá em 2016, e que os governos e a sociedade possam se aproximar da visão
que Jáder possuía sobre a importância da cultura.
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sábado, 22 de dezembro de 2012
Parque Amorim, que desaparecerá. Artigo do pr. Ney Ladeia, Ig Batista da Capunga
Ao longo de todo o
ano de 2012, tenho participado de diversas reuniões, audiências e
debates em torno do mesmo tema: a construção dos viadutos transversais
sobre a Avenida Agamenon Magalhães.
Nestes encontros, e especialmente nos debates, temos tido a oportunidade de ouvir técnicos, gestores, mestres, doutores e especialistas em diversas áreas: arquitetura, engenharia, mobilidade urbana, transporte etc.
Em seus pronunciamentos, uma coisa chama a atenção: incrível unanimidade – todos eles, sem exceção, se posicionam contra o projeto. Nas poucas vezes em que os técnicos do governo tentam justificar a obra, sucumbem diante da falta de apoio e de argumentos – na maioria das vezes, quando indagados, limitam-se a apresentar o que vai ser feito, sem o esforço, que era feito nos primeiros encontros, de tentar argumentar quanto à viabilidade de intervenção.
Não é sem razão que, individual ou coletivamente, têm surgido diversas manifestações em torno do assunto.
Órgãos como o Clube de Engenharia, o Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas, o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-PE), o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU-PE), o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-PE), e, inclusive, vários destes têm se pronunciado pública e oficialmente sobre o assunto. Não pode ser coincidência.
Quando os primeiros questionamentos foram levantados, houve quem pensasse que era o protesto de uns poucos, a se queixarem de prejuízos pessoais ou interesses privados atingidos pela obra. Hoje se vê que a preocupação é com a cidade, com os gigantescos gastos da obra e com os resultados pífios ou mesmo nulos que podem ser obtidos – isto sem falar dos inimagináveis transtornos do período de construção, do prejuízo paisagístico e ambiental e dos custos e inconvenientes das indenizações previstas.
Ao longo da campanha política para a Prefeitura do Recife, o assunto foi imediata e sabiamente retirado de pauta pelo governo, que se apressou em dizer que o mesmo estava sendo revisto, para que não fosse objeto de discussão – teria sido crueldade esperar que o candidato apoiado pelo governo (sozinho, é claro) respondesse por uma ideia que hoje só é defendida pelos técnicos que a conceberam (nem todos) e por eventuais desavisados que não conhecessem bem o projeto.
Permanece nossa esperança de que prevaleça o já tantas vezes demonstrado bom senso do nosso governador, e que a ideia seja definitivamente sepultada, para a tranquilidade de todos e a gratidão da cidade.
Este artigo está publicado no DIÁRIO DE PERNAMBUCO deste sábado, 22 de dezembro, tratando da destruição do Parque Amorim, que será promovida pelo governo do estado e pela prefeitura do Recife. Eu tive a satisfação de erguer minha voz também no DIÁRIO DE PERNAMBUCO, 30 de agosto e que pode ser lido abaixo, mostrando o absurdo que é tal intervenção. Os candidatos, inclusive os vereadores que se propuseram a representar os evangélicos, fugiram do assunto como o diabo da cruz, sem coragem para expor suas opiniões, para não desagradar o governador e seu candidato oficial.
A fotografia do Parque Amorim pode ser vista originalmente no flickr de Thales Payva Photography
Nestes encontros, e especialmente nos debates, temos tido a oportunidade de ouvir técnicos, gestores, mestres, doutores e especialistas em diversas áreas: arquitetura, engenharia, mobilidade urbana, transporte etc.
Em seus pronunciamentos, uma coisa chama a atenção: incrível unanimidade – todos eles, sem exceção, se posicionam contra o projeto. Nas poucas vezes em que os técnicos do governo tentam justificar a obra, sucumbem diante da falta de apoio e de argumentos – na maioria das vezes, quando indagados, limitam-se a apresentar o que vai ser feito, sem o esforço, que era feito nos primeiros encontros, de tentar argumentar quanto à viabilidade de intervenção.
Não é sem razão que, individual ou coletivamente, têm surgido diversas manifestações em torno do assunto.
Órgãos como o Clube de Engenharia, o Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas, o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-PE), o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU-PE), o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-PE), e, inclusive, vários destes têm se pronunciado pública e oficialmente sobre o assunto. Não pode ser coincidência.
Quando os primeiros questionamentos foram levantados, houve quem pensasse que era o protesto de uns poucos, a se queixarem de prejuízos pessoais ou interesses privados atingidos pela obra. Hoje se vê que a preocupação é com a cidade, com os gigantescos gastos da obra e com os resultados pífios ou mesmo nulos que podem ser obtidos – isto sem falar dos inimagináveis transtornos do período de construção, do prejuízo paisagístico e ambiental e dos custos e inconvenientes das indenizações previstas.
Ao longo da campanha política para a Prefeitura do Recife, o assunto foi imediata e sabiamente retirado de pauta pelo governo, que se apressou em dizer que o mesmo estava sendo revisto, para que não fosse objeto de discussão – teria sido crueldade esperar que o candidato apoiado pelo governo (sozinho, é claro) respondesse por uma ideia que hoje só é defendida pelos técnicos que a conceberam (nem todos) e por eventuais desavisados que não conhecessem bem o projeto.
Permanece nossa esperança de que prevaleça o já tantas vezes demonstrado bom senso do nosso governador, e que a ideia seja definitivamente sepultada, para a tranquilidade de todos e a gratidão da cidade.
Este artigo está publicado no DIÁRIO DE PERNAMBUCO deste sábado, 22 de dezembro, tratando da destruição do Parque Amorim, que será promovida pelo governo do estado e pela prefeitura do Recife. Eu tive a satisfação de erguer minha voz também no DIÁRIO DE PERNAMBUCO, 30 de agosto e que pode ser lido abaixo, mostrando o absurdo que é tal intervenção. Os candidatos, inclusive os vereadores que se propuseram a representar os evangélicos, fugiram do assunto como o diabo da cruz, sem coragem para expor suas opiniões, para não desagradar o governador e seu candidato oficial.
A fotografia do Parque Amorim pode ser vista originalmente no flickr de Thales Payva Photography
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quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
Joaquim Barbosa, o nosso Collin Powell? Artigo meu na Folha de PE de hoje.
Na década de 1990, George Bush nomeou o general Collin Powell para a chefia do Estado-Maior das Forças Armadas dos EUA e em 2000, George Bush Jr. nomeou-o Secretário de Estado, tornando-se Powell o primeiro negro a ocupar aqueles postos, responsáveis pela formulação, execução e administração da política externa dos EUA. Filho de imigrantes jamaicanos, veterano da Guerra do Vietnã, Collin Powell encarnava o padrão do ‘sonho americano’, do ‘self-made-man’ e seria capaz de conquistar parte dos eleitores negros simpáticos ao Partido Democrata, mas, o Partido Republicano não aceitou que ele fosse o protagonista em uma chapa presidencial. Pior para o partido, que não compreendeu a revolução demográfica pela qual os EUA estavam passando e foram perdendo largas fatias do eleitorado para os Democratas. Negros, hispânicos, jovens, mulheres, imigrantes, foram todos ignorados pelos Republicanos, que se apresentavam defensores do liberalismo e individualismo extremados, da desregulamentação dos mercados e do estímulo à economia através de cortes de impostos para os ricos! A história e a demografia atropelaram o Collin Powell e o Partido Republicano.
Da mesma forma que o general, Joaquim Barbosa construiu uma carreira ancorada em uma sólida formação acadêmica e competência profissional e ambos ascenderam ao maior dos cargos que ocuparam pelas suas ligações políticas e condição étnica, porque os altos cargos a que chegaram são de indicação pessoal dos presidentes da República. É preciso articulação e lobby para ser indicado, não bastando apenas o mérito pessoal. Barbosa representou, em 2003, a vontade do governo Lula de apresentar-se como o primeiro a indicar um negro para o STF, da mesma forma que, em 2000, o governo Fernando Henrique quis apresentar-se como o primeiro a nomear uma mulher, a ministra Hellen Gracie. Além da absoluta competência e rigor profissional de ambos, pesou o desejo dos presidentes de criar um fato social e político. Semelhantemente, tanto as Forças Armadas quanto a Suprema Corte integram o Estado, mas possuem uma dinâmica e força próprias, proporcionando uma visibilidade ímpar para aqueles que os comandam. Desta forma, começam as especulações sobre uma possível candidatura do ministro Joaquim Barbosa a presidência da República.
Se o ministro decidir enveredar por este rumo, tem vantagens e desafios a superar. O descrédito da classe política, que suas excelências, infelizmente, insistem em alimentar, leva parte da sociedade a um sentimento de que a política só poderá caminhar bem se for conduzida por alguém que não seja político. Essa é uma contradição que pode beneficiar o ministro. Há, ainda, não um fator demográfico, mas um fator geracional que lhe pesa favorável. Um percentual alto de eleitores nasceu depois de 1985, cresceu sabendo que o presidente é eleito, e não percebe como algo essencial a participação do candidato na luta contra a ditadura civil-militar. O ministro poderia apresentar-se como um bom representante para estas novas gerações, que buscam uma nova pauta política para o Estado, que pretende a estabilidade econômica, democrática e a distribuição de renda, mas também reivindicam mais seriedade no trato da coisa pública.
Entre os seus desafios, o primeiro seria a escolha de um partido, pois nosso sistema não permite candidaturas independentes. Um nó difícil, pois são poucos os partidos que não protagonizaram denúncias e escândalos de corrupção recentes, além de vários deles já possuírem seus próprios pré-candidatos à presidência. Um partido pequeno ou um novo colocariam Barbosa diante do grande problema do presidencialismo brasileiro, que é governar sem um partido majoritário no Congresso. Há ainda, a construção de um programa que contemple a questão econômica e a pauta de reformas sociais, mas o marketing do candidato poderia resolver isso, apresentando-o como o aperfeiçoamento da democracia brasileira, associando Fernando Henrique à estabilidade, Lula às reformas sociais e ele, Barbosa ao respeito e ao bom cuidado das práticas políticas e da gestão do Estado. Quem sabe, poderia dar certo. Enfrentaria, ainda, claro, a atual presidente Dilma, pois os números macroeconômicos do país podem não ser os melhores, mas o cidadão comum se preocupa com o desemprego, e este está em queda, aliado a um controle razoável da inflação e à força dos programas sociais. Joaquim Barbosa poderia ser um candidato bastante competitivo, embora a história esteja sempre à espreita, pronta para surpresas, como as que foram reservadas aos Republicanos e ao general Powell.
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quarta-feira, 24 de outubro de 2012
LUTERO, UMA BIOGRAFIA QUE MUDOU A HISTÓRIA
O
aniversário dos 500 anos da Reforma Protestante ocorrerá em 31 de outubro de
2017 e à medida que o evento se aproxima, seminários, congressos, documentários
e uma safra de excelentes livros começam a ser produzidos e publicados. No
Brasil, surge pela primeira vez traduzida em nosso português, a obra “Martinho
Lutero, um destino”, do notável historiador francês Lucien Febvre. O livro foi
publicado em 1928, com traduções para o inglês, espanhol, português lusitano,
mas apenas agora, temos uma edição brasileira. Tal atraso é ainda mais absurdo se
pensarmos que foi uma obra fundamental para a renovação tanto dos estudos sobre
religião, quanto sobre a própria história. A biografia de Lutero, por Febvre, foi
precursora da renovação dos estudos históricos pela célebre escola dos Annales,
procurando compreender o mundo em que Lutero estava inserido, a forma como ele
compreendia o seu tempo e as questões que afetavam a Igreja. Renovava assim, o
trabalho do historiador, pois não era mais a velha biografia, centrada em datas
e eventos. Fazia o mesmo com a análise religiosa, pois nem era uma hagiografia
nem se destinava a condenar o reformador, além de não tratar a religião como
‘ópio’ nem como algo ‘irracional fadado a desaparecer’.
Febvre
escapou, assim, dos dois grandes modelos de estudo que cercavam a religião entre
duas armadilhas. Ou a religião era o ‘ópio do povo’, um aspecto do mundo
ideológico, reflexo da realidade material, ou era uma etapa primitiva do
pensamento humano, destinada inexoravelmente a desaparecer com o avanço da
razão e da sociedade moderna e industrial. Febvre analisou o século 16 de
Lutero buscando as lógicas internas de funcionamento daquela época, sem considerá-la
uma etapa que seria vencida e superada no futuro pelo racionalismo moderno.
Procurando conhecer o que chamava de ‘utensilagem [ou utensílios] mentais’, o
autor procurou compreender a forma de Lutero ver o seu mundo e posicionar-se
diante dele. Seu interesse pela mentalidade do homem moderno já havia produzido
um grandioso estudo sobre o francês Rabelais, contemporâneo de Lutero e
igualmente crítico do mundo religioso da época. Lucien Febvre trilhava um
caminho novo, diferente daquele feito por muitos que se afirmavam marxistas ou weberianos.
A
circulação da edição brasileira da biografia de Lutero, portanto, deverá
ensejar boas provocações entre os curiosos e estudantes da história das
religiões, conhecendo um clássico escrito por um dos mais respeitados
historiadores do século 20. Um livro sem parvoíces do tipo ‘a religião é o ópio
do povo’ ou como ‘uma forma mítica de explicar o mundo que desaparecerá com a
expansão da ciência’, e que, tampouco toma a Reforma como uma ruptura abrupta,
um rompimento espetacular com o mundo medieval. Pelo contrário, somos surpreendidos
pela busca da compreensão dos modos de pensar e de sentir do homem que viveu em
um mundo em transição, que foi Lutero, que titubeou em diversos momentos, antes
de definir-se como pensador seguro, sagaz e maduro, articulador de uma nova
forma de exercício da fé cristã. Uma análise interdisciplinar que busca se
aproximar da mentalidade dos homens que viveram o início dos tempos modernos.
Este é, sem dúvida, um excelente presente para o aniversário da Reforma.
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terça-feira, 23 de outubro de 2012
Lutero e as Teses de Wittemberg
No
dia 31 de outubro de 1517, Lutero tornou público na catedral de Wittemberg,
norte da Alemanha, onde era professor de teologia, um texto contendo uma série
de afirmações sobre as questões de fé mais comuns para a sociedade no início do
século 16. A data escolhida para propagar as suas 95 Teses ou Teses de
Wittemberg, era a véspera do Dia de Todos os Santos, quando pessoas vinham de
todas as partes da Alemanha e da Europa para a cidade de Wittemberg. Ali,
visitariam igrejas onde se expunham relíquias, que eram objetos ou fragmentos
biológicos supostamente pertencidos a algum dos santos da igreja e aos quais se
atribuía poderes miraculosos de cura ou concessão de graça, e aproveitariam
para comprar as indulgências, documentos emitidos pelo clero e pelo papado que
concediam perdão por pecados cometidos.
Lutero
tornava pública a sua teologia, na qual defendia que a salvação se dá apenas pela
graça soberana de Deus. Para ele, o clero não tem poderes para declarar o
perdão de pecados e as indulgências não possuem valor intrínseco para promover
a salvação de nenhum cristão. As Teses de Wittemberg não objetivavam o
rompimento com a igreja, mas buscavam responder ao anseio mais fundamental que
movia o irmão Martinho, que se tratava do que ele poderia fazer para obter a
graça e misericórdia de Deus para com sua alma. E aí, Lutero confrontou-se
severamente com o problema da venda das indulgências e reafirmou o papel central
da graça de Deus que, através do sacrifício de Cristo, perdoou e reconciliou os
homens consigo, de forma gratuita e plena. Isso tornava inútil o perdão
indulgencial, negociado naqueles dias pelo monge Tetzel, que afirmava que cada
moeda depositada no altar garantia uma alma que saía do purgatório ao céu.
As Teses tratavam quase tão somente destas questões, mas, naquele outono, a força desta crítica rompeu um dique há muito represado. A igreja medieval não conseguia conciliar o pastoreio de almas com a condição de ser um reino e administrar territórios, impostos e guerras. Naqueles primeiros anos do século 16, Roma estava assistindo, ainda, ao trabalho dos grandes artistas do renascimento, a exemplo de Michelangelo e Rafael, que, contratados principalmente pela igreja, promoviam a reforma de diversos espaços públicos da cidade. O pagamento destes artistas, a função de mecenato desempenhada pelos papas Júlio II e Leão X, foi cumprida com a venda das indulgências e pela negociação de cargos eclesiásticos. Em meio a isso, as ideias de Lutero corriam a Europa por meio da imprensa, uma invenção chinesa recriada por Gutemberg em 1480.
A resposta de uma alma angustiada pela sua salvação encontrou uma Alemanha dividida em reinos, com importantes cidades comerciais e um povo que já não mais pretendia submeter-se às imposições dos Estados Pontifícios. Diversos príncipes alemães viram na pregação do jovem monge a oportunidade de construir sua autonomia política. O povo, por sua vez, encontrou consolo em uma doutrina que simplificou a fé, a adoração e colocava cada pessoa diretamente em diálogo com Deus através de Seu filho, Jesus Cristo. Uma doutrina que afirmava que não há nada nas boas obras, por si mesmas, que possa obrigar Deus a fazer nada para com o homem, mas, que o Seu amor e o sacrifício de Cristo são suficientes para a salvação pessoal.
O debate entre Lutero e Roma nos anos seguintes evoluiu para a discussão da questão dos sacramentos, da organização eclesial, da submissão da igreja local em relação à igreja romana. A cisão foi inevitável. Essa nova compreensão da fé contribuiu, ainda, para a afirmação do homem moderno, racional, que pergunta sobre o poder, que preza pela sua liberdade e se põe como sujeito ativo diante do mundo e da história.
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