quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Pena de morte: uma polêmica execução na Geórgia agita os EUA (El País)


Pouco importa que um ex-diretor do FBI, William Sessions, partidário feroz da pena de morte, haja solicitado que se execute hoje a Troy Davis porque seu caso faz água por todos os lados.

O último recurso que restava a este preso de 42 anos, condenado à pena capital por uma acusação de matar em 1989 a um policial que estava fora de serviço, foi rejeitado hoje pela Corte de Perdões do Estado da Geórgia. O tribunal decidiu não comutar a pena por prisão perpétua sem dar mais explicações.

A execução de Davis foi suspensa no último momento em três ocasiões durante mais de duas décadas. Nada faz pensar que isso ocorra hoje às sete da noite, quando Davis receba a injeção letal em uma penitenciária de Jackson (Geórgia).

Excepcionalmente, a Suprema Corte dos EUA concedeu a Davis em 2009 uma vista para que provasse sua inocencia aos magistrados, algo incomum e que não havia sido utilizado há 50 anos,já que os réus normalmente procuram tribunais inferiores.

A Suprema Corte transferiu o caso a um juiz federal da Geórgia que finalmente decidiu que as provas que a defesa apresentava eram 'pura fumaça'. Apenas restava a Corte de Perdões, que finalmente rejeitou o recurso do réu.

O caso de Davis obteve relevância internacional, já que instituições como a União Européia, organizações como a Anistia Internacional e políticos como o ex-presidente dos EUA, Jimmy Carter, além do Papa, pediram ao estado da Geórgia que perdoasse ao prisioneiro ou lhe comutasse a sentença.

Nos últimos anos, sete testemunhas da acusação original que participaram no julgamento de 1991 mudaram suas declarações.

O caso desmoronou. Não há testemunhas, não há arma do crime. Uma testemunha (Quiana Glover) assegura que o homem cujo testemunho foi determinante em sua condenação (Sylvester Cole) lhe confessou em uma festa que foi quem matou o agente. Mas, nada se pode fazer. Muito provavelmente, o prisioneiro será executado hoje na Geórgia. Sua morte será a 34a. este e a 1.268 desde que o Supremo reinstaurou os homicídios legais em 1976.

EL PAÍS.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Artigo meu no Diário de Pernambuco de hoje:120 anos de liberdade religiosa no Brasil


A primeira constituição da república foi promulgada em fevereiro de 1891 e marcou a separação entre o Estado e a Igreja no Brasil. Durante a Colônia e o Império, a Igreja Católica era a igreja oficial e qualquer outra fé era proibida. Desta forma, judeus foram forçados à conversão sob a marca de “cristãos-novos” e o Brasil foi concebido como uma terra a ser protegida dos ‘hereges protestantes’. Em 1808, a vinda da família real provocou uma tímida abertura, pois a crescente presença de ingleses, a maioria protestantes, levou ao reconhecimento do direito de celebrarem seus cultos religiosos. A fórmula para isso foi autorizar cultos no interior de casas sem aparência de igrejas e na língua dos celebrantes, de modo a não haver proselitismo.

Durante o século XIX, havia o agravante de que apenas os casamentos em igrejas católicas eram reconhecidos, não havendo sequer o casamento civil. Morrer também era um problema, pois os cemitérios eram administrados pelo clero e fechado aos ‘infiéis’. O imperador chegou a ceder para a Inglaterra, terrenos nas principais cidades do Brasil para a construção de campos santos, onde os protestantes poderiam ser sepultados. Tornou-se célebre em Pernambuco a polêmica travada nos jornais entre Abreu e Lima e o bispo Cardoso Ayres pelo direito de liberdade religiosa, culminando com a negação de sepultura ao general. O problema só foi resolvido porque o “Cemitério dos Ingleses” abriu-se para receber o corpo do valente Abreu e Lima, onde está até hoje como testemunha daqueles dias difíceis. O imperador também tinha o direito de nomear os bispos e as ordens papais apenas eram cumpridas no Brasil com a sua aquiescência, situação que provocou graves tensões entre o Estado e a Igreja. De fato, os bispos viviam no dilema da dupla fidelidade que precisavam manter, ao Papa e ao Rei, tendo que escolher a este último em caso de conflito.

A república separou a Igreja e o Estado. Foi criado o casamento e o registro de nascimento civis e os cemitérios passaram a ser administrados pelas prefeituras; o Estado não tinha mais uma religião oficial e inscreveu-se o direito individual de escolha de religião. É preciso lembrar que, apesar desse avanço, a cultura popular era marcada pelo enfrentamento religioso e ocorriam muitos confrontos entre católicos e adeptos das ‘seitas protestantes’. Mesmo assim, as igrejas evangélicas foram as que mais saudaram a Carta Magna de 1891, pois possuíam planos específicos de criação de campos missionários no país. Judeus e muçulmanos se sentiram igualmente contemplados, pois o início do século XX foi um momento de importantes ondas migratórias destes grupos para o Brasil. Os católicos também saudaram as mudanças porque, mesmo sem o status de religião oficial, não veriam mais a sua igreja sofrer intervenção do governante de plantão. Religiões de matrizes africanas, entretanto, demorariam muito mais a terem respeitadas tais garantias de liberdade.

Hoje, apesar da ressurgência de fundamentalistas que tentam pautar o Estado pelas reivindicações de seus grupos e promovem preconceitos contra crenças diferentes da sua, o Brasil pode se orgulhar de ser um dos poucos lugares onde encontramos em um mesmo bairro mesquitas, sinagogas, centros kardecistas, terreiros, igrejas católicas e evangélicas. E que todos passam pelas mesmas calçadas em direção a seus lugares de culto e reunião sem temer-se ou agredir-se mutuamente.