quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

O telhado do Cine Teatro Recreios Benjamin, em Timbaúba, desabou!




O editorial do jornal “A Serra”, que circulou em Timbaúba no dia 17 de maio de 1913, seguia assinado por Jáder de Andrade, um jovem jornalista, político e empresário daquele município, que seria, em poucos meses, nomeado redator do Diário de Pernambuco. Jáder não hesitou nem mediu palavras para anunciar a obra de que a cidade mais necessitaria: “Nesta cidade há, talvez, necessidades igualmente urgentes e imprescindíveis: nenhuma, porém, mais imprescindível e mais urgente do que a necessidade de um teatro, condizendo com o adiantamento do nosso desenvolvimento moral e material”. O Cine Teatro Recreios Benjamin seria inaugurado, sob os seus auspícios financeiros, na tarde do domingo de 05 de março de 1916, com um programa que incluiu um documentário sobre a Guerra Balcânica, o drama “Um Segredo” e uma comédia, do francês Max Linder, “O Enforcado”. Estranhos aos nossos dias, os títulos estavam em plena sintonia com a década de 1910. Os Bálcãs foram o estopim da Primeira Guerra; o romance era a forma clássica da narrativa burguesa; e Max Linder era um grande artista, que Chaplin tributava como seu mestre.

O Cine Teatro seguiu sendo o palco da cidade. Manoel Borba começou ali a sua campanha vitoriosa ao governo estadual; companhias de teatro de diversos estados cruzaram suas coxias; orquestras ocuparam seu proscênio; o seu cinema foi a janela que alargou o horizonte de mais de uma geração. A agitação cultural e política dos anos 20 em Timbaúba tiveram ali o um de seus centros, além dos jornais do lugar. Neste ambiente, nasceram e ganharam o mundo, muitos artistas, professores, políticos e agitadores culturais de artes várias. Era a coroação de uma economia que não dependia da cana de açúcar, que produzia muito algodão, café, frutas, farinha e gado; tudo estimulado pela ferrovia que ligava o Recife a Campina Grande e atravessava a Mata Norte. O Recreios Benjamin integra um conjunto de outros equipamentos construídos em situação semelhante, entre 1910 e 1940: o Polytheama, de Goiana; o Guarani, de Triunfo; o Apolo, em Palmares; o Avenida e o Santa Rosa, em Caruaru; o São José, em Afogados da Ingazeira. 

Na noite passada de 26 de dezembro, o teto do Cine Teatro desabou, culminando uma trajetória de descaso e abandono. Tombado pelo estado em 1983, não foi desapropriado. Seguiu-se um imbróglio em que o prédio não recebia uso pelos proprietários, ao tempo em que governos diziam não investir por ser propriedade privada. Desde então, recebeu apenas intervenções pontuais, como uma reforma no início dos anos 90, em que o palco de madeira foi substituído por um de... cimento. Em 2011, surgiu um movimento de estudantes e professores da rede pública e privada, reivindicando o cuidado e o bom uso do teatro, que resultou em audiência até com o governador. A Fundação de Cultura Jáder de Andrade bateu-se igualmente por esta causa. Seguiram-se diversas promessas, vários gerúndios, e o prédio continuou fechado, à espera de providências que não foram tomadas. Até que, quem sabe, sem suportar mais um natal sem uso, os velhos braços de madeira não suportaram mais e arriaram sob o peso dos dias e a fúria de cupins não combatidos. Resta a esperança de um projeto de restauração contemplando o seu centenário, que virá em 2016, e que os governos e a sociedade possam se aproximar da visão que Jáder possuía sobre a importância da cultura.

sábado, 22 de dezembro de 2012

Parque Amorim, que desaparecerá. Artigo do pr. Ney Ladeia, Ig Batista da Capunga



Ao longo de todo o ano de 2012, tenho participado de diversas reuniões, audiências e debates em torno do mesmo tema: a construção dos viadutos transversais sobre a Avenida Agamenon Magalhães.

Nestes encontros, e especialmente nos debates, temos tido a oportunidade de ouvir técnicos, gestores, mestres, doutores e especialistas em diversas áreas: arquitetura, engenharia, mobilidade urbana, transporte etc.

Em seus pronunciamentos, uma coisa chama a atenção: incrível unanimidade – todos eles, sem exceção, se posicionam contra o projeto. Nas poucas vezes em que os técnicos do governo tentam justificar a obra, sucumbem diante da falta de apoio e de argumentos – na maioria das vezes, quando indagados, limitam-se a apresentar o que vai ser feito, sem o esforço, que era feito nos primeiros encontros, de tentar argumentar quanto à viabilidade de intervenção.

Não é sem razão que, individual ou coletivamente, têm surgido diversas manifestações em torno do assunto.
Órgãos como o Clube de Engenharia, o Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas, o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-PE), o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU-PE), o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-PE), e, inclusive, vários destes têm se pronunciado pública e oficialmente sobre o assunto. Não pode ser coincidência.

Quando os primeiros questionamentos foram levantados, houve quem pensasse que era o protesto de uns poucos, a se queixarem de prejuízos pessoais ou interesses privados atingidos pela obra. Hoje se vê que a preocupação é com a cidade, com os gigantescos gastos da obra e com os resultados pífios ou mesmo nulos que podem ser obtidos – isto sem falar dos inimagináveis transtornos do período de construção, do prejuízo paisagístico e ambiental e dos custos e inconvenientes das indenizações previstas.

Ao longo da campanha política para a Prefeitura do Recife, o assunto foi imediata e sabiamente retirado de pauta pelo governo, que se apressou em dizer que o mesmo estava sendo revisto, para que não fosse objeto de discussão – teria sido crueldade esperar que o candidato apoiado pelo governo (sozinho, é claro) respondesse por uma ideia que hoje só é defendida pelos técnicos que a conceberam (nem todos) e por eventuais desavisados que não conhecessem bem o projeto.

Permanece nossa esperança de que prevaleça o já tantas vezes demonstrado bom senso do nosso governador, e que a ideia seja definitivamente sepultada, para a tranquilidade de todos e a gratidão da cidade.

Este artigo está publicado no DIÁRIO DE PERNAMBUCO deste sábado, 22 de dezembro, tratando da destruição do Parque Amorim, que será promovida pelo governo do estado e pela prefeitura do Recife. Eu tive a satisfação de erguer minha voz também no DIÁRIO DE PERNAMBUCO, 30 de agosto e que pode ser lido abaixo, mostrando o absurdo que é tal intervenção. Os candidatos, inclusive os vereadores que se propuseram a representar os evangélicos, fugiram do assunto como o diabo da cruz, sem coragem para expor suas opiniões, para não desagradar o governador e seu candidato oficial.

A fotografia do Parque Amorim pode ser vista originalmente no flickr de Thales Payva Photography

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Joaquim Barbosa, o nosso Collin Powell? Artigo meu na Folha de PE de hoje.


Na década de 1990, George Bush nomeou o general Collin Powell para a chefia do Estado-Maior das Forças Armadas dos EUA e em 2000, George Bush Jr. nomeou-o Secretário de Estado, tornando-se Powell o primeiro negro a ocupar aqueles postos, responsáveis pela formulação, execução e administração da política externa dos EUA. Filho de imigrantes jamaicanos, veterano da Guerra do Vietnã, Collin Powell encarnava o padrão do ‘sonho americano’, do ‘self-made-man’ e seria capaz de conquistar parte dos eleitores negros simpáticos ao Partido Democrata, mas, o Partido Republicano não aceitou que ele fosse o protagonista em uma chapa presidencial. Pior para o partido, que não compreendeu a revolução demográfica pela qual os EUA estavam passando e foram perdendo largas fatias do eleitorado para os Democratas. Negros, hispânicos, jovens, mulheres, imigrantes, foram todos ignorados pelos Republicanos, que se apresentavam defensores do liberalismo e individualismo extremados, da desregulamentação dos mercados e do estímulo à economia através de cortes de impostos para os ricos! A história e a demografia atropelaram o Collin Powell e o Partido Republicano.

Da mesma forma que o general, Joaquim Barbosa construiu uma carreira ancorada em uma sólida formação acadêmica e competência profissional e ambos ascenderam ao maior dos cargos que ocuparam pelas suas ligações políticas e condição étnica, porque os altos cargos a que chegaram são de indicação pessoal dos presidentes da República. É preciso articulação e lobby para ser indicado, não bastando apenas o mérito pessoal. Barbosa representou, em 2003, a vontade do governo Lula de apresentar-se como o primeiro a indicar um negro para o STF, da mesma forma que, em 2000, o governo Fernando Henrique quis apresentar-se como o primeiro a nomear uma mulher, a ministra Hellen Gracie. Além da absoluta competência e rigor profissional de ambos, pesou o desejo dos presidentes de criar um fato social e político. Semelhantemente, tanto as Forças Armadas quanto a Suprema Corte integram o Estado, mas possuem uma dinâmica e força próprias, proporcionando uma visibilidade ímpar para aqueles que os comandam. Desta forma, começam as especulações sobre uma possível candidatura do ministro Joaquim Barbosa a presidência da República.

Se o ministro decidir enveredar por este rumo, tem vantagens e desafios a superar. O descrédito da classe política, que suas excelências, infelizmente, insistem em alimentar, leva parte da sociedade a um sentimento de que a política só poderá caminhar bem se for conduzida por alguém que não seja político. Essa é uma contradição que pode beneficiar o ministro. Há, ainda, não um fator demográfico, mas um fator geracional que lhe pesa favorável. Um percentual alto de eleitores nasceu depois de 1985, cresceu sabendo que o presidente é eleito, e não percebe como algo essencial a participação do candidato na luta contra a ditadura civil-militar. O ministro poderia apresentar-se como um bom representante para estas novas gerações, que buscam uma nova pauta política para o Estado, que pretende a estabilidade econômica, democrática e a distribuição de renda, mas também reivindicam mais seriedade no trato da coisa pública.

 Entre os seus desafios, o primeiro seria a escolha de um partido, pois nosso sistema não permite candidaturas independentes. Um nó difícil, pois são poucos os partidos que não protagonizaram denúncias e escândalos de corrupção recentes, além de vários deles já possuírem seus próprios pré-candidatos à presidência. Um partido pequeno ou um novo colocariam Barbosa diante do grande problema do presidencialismo brasileiro, que é governar sem um partido majoritário no Congresso. Há ainda, a construção de um programa que contemple a questão econômica e a pauta de reformas sociais, mas o marketing do candidato poderia resolver isso, apresentando-o como o aperfeiçoamento da democracia brasileira, associando Fernando Henrique à estabilidade, Lula às reformas sociais e ele, Barbosa ao respeito e ao bom cuidado das práticas políticas e da gestão do Estado. Quem sabe, poderia dar certo. Enfrentaria, ainda, claro, a atual presidente Dilma, pois os números macroeconômicos do país podem não ser os melhores, mas o cidadão comum se preocupa com o desemprego, e este está em queda, aliado a um controle razoável da inflação e à força dos programas sociais. Joaquim Barbosa poderia ser um candidato bastante competitivo, embora a história esteja sempre à espreita, pronta para surpresas, como as que foram reservadas aos Republicanos e ao general Powell.