quinta-feira, 5 de julho de 2012

80 anos da Liga Eleitoral Católica, artigo meu no Diário de Pernambuco


A república foi proclamada em 1889 e trouxe um reposicionamento das relações entre a Igreja Católica e o Estado. Um decreto de janeiro de 1890 separou os dois através de diversas prescrições legais. O casamento e o registro de nascimento civil foram criados, os cemitérios passaram a ser administrados pelas prefeituras, as escolas religiosas eram livres, mas o ensino nas escolas públicas seria laico. Mesmo que muito presente no cotidiano social, a redução da influência política foi patente para a Igreja, que sofreu ainda com a sua falta de unidade nacional, pois não havia organismos que articulassem a ação das dioceses em nível nacional. A CNBB só seria criada em 1952, com a participação decisiva do então jovem bispo Dom Hélder Câmara.
Na década de 1920, o grande artífice da reação da Igreja foi o cardeal do Rio de Janeiro, Dom Sebastião Leme. O cardeal deu uma feição minimamente nacional à Igreja Católica e criou as condições para a sua presença mais organizada no ambiente republicano. A inauguração do Cristo Redentor em 1931 foi um marco nesse processo. A cerimônia contou com a presença da maioria dos bispos do Brasil e, o mais importante, com Vargas e o seu ministério presentes, perfilados, ouvindo a pregação do cardeal que, fazendo juz a seu nome, dava rumo à Igreja Católica nesses novos tempos. Sobre a participação política, Dom Leme sempre recusou a ideia de criar um partido católico, como pensava o influente intelectual Jackson de Figueiredo. A influência da Igreja deveria ocorrer, na opinião dos bispos, pela formação de líderes comprometidos com o ideário católico, que ocupassem funções públicas.
Em 1932, Vargas promulgou o novo Código Eleitoral, que previa o voto secreto, a criação da Justiça Eleitoral, o fim do voto distrital e o voto feminino. Agora, a estratégia traçada por Dom Leme começaria a dar resultados. Além da pressão das mulheres e seus movimentos sufragistas, os bispos também pressionaram pela adoção do voto amplo feminino. O clero compreendia que as mulheres eram mais próximas da influência da Igreja e mais dispostas a votar em candidatos com ela identificados. Ainda em 1932, Vargas convocou eleições para a assembleia constituinte. Os bispos estimularam, então, a organização da Liga Eleitoral Católica (LEC), que elaborou uma plataforma mínima de princípios a serem apresentados aos candidatos que pretendessem o apoio da Igreja. Apenas a partir do comprometimento com tais princípios, haveria a recomendação de voto aos fiéis.
Em essência, a LEC queria o compromisso de que o parlamentar não apoiaria projetos que favorecessem a dissolução do casamento, que impedissem a assistência religiosa em hospitais e nas forças militares, liberdade para as escolas religiosas, ensino religioso na escola pública e que o Estado instituísse mecanismos de proteção social para o trabalhador, defendidos desde a proclamação da Rerum Novarum pelo papa Leão XIII. A LEC estruturou-se e disseminou suas atividades pelo país, mobilizando o eleitorado e difundindo seu programa. Elegeu parlamentares e conseguiu aprovar ou vetar para a constituição de 1934 todas as suas propostas, incluindo as questões sociais, que seriam incorporados pelo trabalhismo varguista. A Liga foi uma estratégia vitoriosa que repôs a igreja no centro do debate político pelas próximas décadas.

Um comentário:

  1. Excelente texto Claudio.
    Nunca tinha ouvido falar desta liga!

    Já pode ser o nosso primeiro programa "Almanaque de História" :)

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