sábado, 8 de maio de 2010
Entendendo a crise econômica e a crise na Grécia (2).
Depois de 1929 e da tragédia da II guerra, muitas ilusões sobre o papel da economia e da ciência se desfizeram. Uma delas, que arruinou as pretensões dos positivistas do século XIX, era que a ciência seria capaz de explicar tudo (tudo mesmo, do início do universo e da vida, ao funcionamento de todas as coisas e o seu final). Os positivistas criam igualmente que a ciência traria o Progresso e a paz, em um mundo conduzido pela razão. As bombas atômicas demonstraram que a física e a política estão intimamente ligadas e os programas científicos são essenciais à segurança nacional de qualquer potência. A outra ilusão era a de que "a mão invisível do mercado" solucionaria todas as crises antes que ocorressem. A fé cega no liberalismo e a ausência de instrumentos para controlar, fiscalizar, regulamentar e proteger o mercado [está provado que o mercado precisa ser protegido até mesmo de si próprio] transformou a economia americana em um trem desgovernado rumo a um abismo.
Os professores no vídeo acima poderiam ter acrescentado que, da mesma forma que na crise de 2008, a de 1929 foi precedida por um longo período de governo do Partido Republicano, defensor intransigente do liberalismo e da não-intervenção do Estado na economia. Os EUA foram administrados por um longo período de presidentes republicanos, de 1897 a 1933, onde foram derrotados apenas pelo democrata Woodrow Wilson no período 1913/1921. Sobre Wilson e a sua geração com novas idéias para os EUA escrevemos AQUI.
A crise de 1929 provocou a queda dos republicanos e a eleição de Franklin Delano Roosevelt em 1932 [sobrinho de Theodore, quem disse que nos EUA também não há oligarquias?] seguida de TRÊS reeleições: 1936, 1940, 1944. Morreu no iniciozinho do QUARTO MANDATO presidencial. Depois dele, os republicanos conseguiram aprovar a proibição de mais de uma reeleição [ficaram com medo, rsrs]. Qual a grande novidade de FDR? Trouxe da Inglaterra John Maynard Keynes, que defendia diversas medidas de regulação e estímulo da economia pelo Estado. Tem sido muito comum no último ano que os jornais e revistas apresentem os projetos de Obama na saúde, na economia, no sistema bancário, etc. como "o maior pacote de intervenção e regulação da economia desde o New Deal de Roosevelt/Keynes".
O pós-guerra foi um período de intenso crescimento capitalista, tanto na Europa Ocidental quanto nos EUA, estimulado pela estabilidade política, pela expansão do capital, do consumo e pela expansão do papel do Estado. O motor desse crescimento foi duplo: por um lado, a melhoria geral das condições de vida das classes operárias, a constituição de uma forte classe média, tanto na Europa quanto nos EUA [em boa parte, as elites econômicas entenderam que precisavam melhorar a condição de vida de suas sociedades até para poder afastá-las da influência crescente do socialismo no pós-guerra]. Por outro, as elites políticas entenderam que o Estado deveria assumir um papel mais ativo na economia e na sociedade.
Sobre o papel do Estado nesse processo, lembremos que o modelo europeu chamou-se de Welfare State e foi marcado pela construção de uma ampla rede de excelentes serviços públicos prestados à população, ancorados [obviamente] em um igual crescimento da carga tributária nesses países. Os EUA, com sua tradição política/ideológica de defesa das liberdades individuais e da iniciativa individual sobre todas as coisas [é bom lembrar que isso é o discurso oficial, afinal, seria muito bom saber a opinião dos pobres sobre o que eles acham da tal 'liberdades individuais']. O período 1945/1973 foi tão bom para o capitalismo que muitos chamam o momento de "era de ouro".
Até que vieram as crises do petróleo de 1973 e 1979, onde o barril de petróleo saiu da faixa dos 3 para 27 dólares. O novo patamar elevou brutalmente todos os custos econômicos e pressionou fortemente os orçamentos dos países que haviam construído e mantinham o Welfare State. No Brasil a crise fez-se sentir através do esgotamento dos financiamentos externos que haviam financiado o intenso crescimento do período 1966/1973. A década de 1980 foi marcada pela eleição de governantes que passaram a defender a redução do papel do Estado na economia e na sociedade, um regresso do liberalismo, a adoção de uma série de políticas que passaram a ser chamadas de NEOLIBERAIS. O ponto de partida foi a vitória dos conservadores na Inglaterra em 1979 e a indicação de Margaret Tatcher como primeira-ministra e a eleição nos EUA do ator de filmes de cowboy Ronald Reagan, em 1980. A dupla Reagan/Tatcher iniciou o processo de desregulamentação dos mercados, das bolsas, de crescimento da especulação financeira que resultaram na evaporação dos investimentos em 2008.
Da mesma forma que no período que antecedeu 1929, os EUA foram governados pelos republicanos desde 1969 até 2008, que foram batidos apenas pelo batista e democrata Jimmy Carter no período 1976/1980 e por Bill Clinton entre 1992/2000. É impossível deixar de fazer relações entre as políticas dos republicanos de desregular os mercados, o crescimento da especulação e das fraudes diante da inércia do Estado e a arrebentação de crises. Da mesma forma que com Roosevelt em 1932, o início da década de 2010 ocorre com o regresso de um intenso debate sobre o papel do Estado na economia.
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Interessante sua abordagem com relação a crise de 1929.
ResponderExcluirAgora o que achei mais curioso foi que algumas de suas postagens são bem parecidas com as minhas (o tema).
Também tenho blog > http://pistasdahistoria.blogspot.com
Se puder dá uma olhada e deixar comentários já que é professor, portanto meu colega de profissão.
Sugestões são bem-vindas.
Abraço,
Randerson Figueiredo
Oi Randerson, estou olhando e colocando a indicação na lista de blogs ao lado. Estas postagens sobre a crise continua, como você pode ver, tem mais umas três. Um grande abraço, e vamos continuar as conversas.
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